segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Conversas à luz de vela no castelo de Saint-Fargeau

Ao cair da tarde, ao final do século XIX, os empregados em libré percorriam os quartos, os vestíbulos, a sala de bilhares, as salas de jantar, salões e boudoirs acendendo, aos poucos, como numa cena de contos de fadas, as lamparinas do tempo de meu pai.

Um teatro de sombras, que não conheci, animava-se na noite. Lá estava um ancião, mas não era meu avô, era o pai de meu avô.

Juntos ao bispo, o vigário, um general previamente tirado de Prévert, dois coronéis, visitantes hospedados desde cinco ou seis meses, nossos primos da Bretanha ou da Provence.

Não compareciam nem préfets de police, nem banqueiros.

E, cercados de lacaios em uniforme azul à la française conduzindo candelabros, todo esse bonito mundo esvaecido passava, em cortejo, à sala de refeições.



Nem tentemos imaginar o que se conversava à mesa. Nada de genial, imagino.



Mas a história tem segredos que os livros e o cinema terão dificuldade em nos comunicar.

Há incógnitas maiores do que o nome do Máscara de Ferro ou o enigma do Templo: são as palavras de meu avô, a atitude de minha avó, o perfume daquela época, o ar do tempo, toda a banalidade incomparável da vida de todos os dias.

Não é isso que quis dizer um dos personagens de Malraux ‒ Garine, em Les Conquérants ‒ quando perguntava se realmente valia a pena escrever livros que não fossem memórias?

É para recordar de modo mais perfeito as entonações de meu avô, seu odor sem igual, seus gestos imperceptíveis, sua figura altiva que escrevi estas recordações.

(Autor: Jean d'Ormesson, “Au plaisir de Dieu”, Ed. Gallimard, 1980, 626 páginas.)




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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Aspectos das famílias que deram vida aos castelos

Azay-le-Rideau refletido na água

“Meu avô era um velho distinto, vivendo de suas recordações. Ele permanecia apaixonadamente ligado à monarquia legítima.

“Flutuava entre nós, certamente um pouco acima de nós, um personagem silencioso e ausente : era o rei.

Nós não dávamos importância aos homens de teorias. Gostávamos dos pintores, dos arquitetos, dos homens de guerra e de Deus.

O castelo da família representava nossa própria mitologia. O castelo tinha um papel imenso em nossa vida de todos os dias.

“Talvez se pudesse dizer que ele era a encarnação do nome : ambos eram envolvidos na mesma atmosfera do sagrado. (...)



Maintenon: galeria dos antepassados
“E como tínhamos razão de desconfiar da técnica !

Nós a detestávamos, como detestávamos o progresso. As máquinas e os motores começavam a crepitar seus estalos e a percorrer nossas estradas…

“O telefone começava a tilintar, não em nossa casa, mas na casa de nossos primos. Um verdadeiro frenesi de mudanças tomou conta dos homens.

“E pouco a pouco tudo nos escapava das mãos… e todos repetiam em torno de mim que, sem Deus e sem o rei, sem esperança e sem fé, os homens tinham escolhido sua perdição.”

(Autor: Jean d'Ormesson, “Au plaisir de Dieu”, Ed. Gallimard, 1980, 626 páginas.)



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